A SERESTA EM DIAMANTINA (MG)

Tradição musical em Diamantina é passada de pai para filho ao longo das décadas


Adriana Maria Ribas da Cruz
12/10/2011
  • Diamantina, em Minas Gerais, onde está sendo realizado o Festival de História (fHist) – uma iniciativa da Revista de História da Biblioteca Nacional – é, certamente, uma das cidades brasileiras onde a seresta melhor se incorporou à rotina dos moradores. É, entre tantas outras, mais uma tradição provocada pelos tempos de exploração de ouros e diamantes na região, graças às influências de pessoas vindas de todas as partes do Brasil e da Europa.
    No século XVIII, grandes instrumentistas destacados para tocarem nas igrejas acabaram cooptados pela “música profana” nos salões da cidade e, de lá, saíram às ruas. Foi inevitável se unirem também aos trovadores que percorriam a cidade como numa “procissão”. Tudo isso, posteriormente, incentivado por seu filho mais ilustre, Juscelino Kubitschek, famoso amante das serestas e que, quando se tornou presidente, tratou de fundar conservatórios de música pelos cinco cantos de Minas Gerais – sendo um deles, claro, em sua terra natal.
    Hoje, existem cinco grupos seresteiros – que cultivam o amor à música como herança familiar. Ao longo dos tempos, a tradição foi reformulada na Vesperata que, em vez de pôr cantores e instrumentistas em procissão, acontece uma espécie de “seresta invertida”: os músicos ficam nas sacadas dos prédios históricos enquanto o público, embaixo, percorre as ruas da cidade.
    “O ambiente de Diamantina favorece a tudo isso. Temos uma ligação forte com o passado, e a seresta se incorporou ao nosso espírito como se traduzisse a alma do nosso povo”, conclui Adriana Maria Ribas da Cruz, professora de música em Diamantina e autora do artigo sobre a história da seresta, que você confere abaixo.



    Seresteiros levam público em 'procissão' pelas ruas da cidade
    Seresteiros levam público em
    'procissão' pelas ruas da cidade
    Há mais de 400 anos a ópera desperta paixões. Este gênero criou um acervo de grande riqueza representando composições belíssimas do romantismo grego que traduz o mais alto sentimentalismo musical. Ao longo do século XIX, progressivamente, ela deixa de ser uma arte destinada às elites e cativa o público. A evolução da história da ópera e da canção proporciona posteriormente o surgimento da Modinha. Com a propagação da religião cristã, a arte musical se estabelece muitos séculos na igreja, e só reaparece no mundo profano, completamente degenerada quando surgiram as Cruzadas. Este fato histórico que favoreceu a autoridade dos reis, também foi responsável por abrir as portas da igreja oferecendo a musica um “ambiente” e contexto diferente: Como novo templo, o lar, novo altar, a mulher, novo santuário o coração, e nova religião o amor. Com esta transformação, apareceram os primeiros romances cavalheirescos.
    Assim surgiu a partir do século XII a arte trovadoresca na França, que se difundiu por toda a Alemanha, e, especialmente na Itália no século XV. Dos paises europeus, Portugal desenvolve a Modinha no final do século XVIII quando se tornou conhecida a partir do sucesso na Côrte Portuguesa. Modinha é uma palavra que designa as canções de salão em língua materna e musica do período setecentista. Este canto chegado com os colonizadores agradou o brasileiro, e o seu aparecimento marcou a criação do primeiro gênero do canto nacional dirigido para as novas camadas medias das cidades. O século XVI é a época em que a canção romântica transporta-se de Portugal para o Brasil com o título de Modinha, estabelecendo entre nós como símbolo de nacionalidade.
    Em virtude das grandes mudanças políticas ocorridas no século XIX desde a vinda da família real para o Brasil, houve o desenvolvimento da música que teve importante influência da cultura européia. Músicas de diferentes gêneros e estilos, inclusive a modinha, contribuíram para o crescimento da musica profana que modificou o panorama musical, tendo maior projeção diante das músicas tocadas nas igrejas. De todos os reis, D. João VI, foi o que mais beneficiou o desenvolvimento da música no Brasil.



    Violão que JK, amante das serestas, autografou para um amigo: o instrumento fica exposto numa pousada da cidade. Foto: Adriana Ribas
    Violão que JK, amante das serestas, autografou para um amigo: o instrumento fica exposto numa pousada da cidade. Foto: Adriana Ribas
    A música produzida na Colônia brasileira foi adquirindo feições próprias quando se definiu a Modinha. Esse gênero surgiu e estabeleceu na Bahia e em Minas Gerais, estados considerados as duas escolas poéticas do Brasil. Apareceram os primeiros trovadores brasileiros que acalentaram as primeiras modinhas nacionais cantadas e dedilhadas por trovadores de rua e de salão. Em Minas colonial a música profana difundida na sociedade mineira, seja trovadoresca ou canção de amor, a modinha, tem estilo na canção baseada na poesia de conteúdo sentimental e se expressa numa sensibilidade em música. Os versos escritos pelos poetas eram musicados e cantados geralmente em trovas e sonetos cantando o amor e a saudade. Da modinha dos pianos dos salões para os violões das esquinas, nasce a modinha integrada à seresta – a modinha seresteira – (linguagem rebuscada dos grandes poetas com a sonoridade mestiça dos choros que traduziam ritmos importados da Europa) começa a formar-se pelas manifestações populares, e retrata o ambiente social onde é cultivada nas noites de luar. Dos salões e dos saraus mineiros, a modinha passou à serenata nas ruas da cidade. Em torno de uma atmosfera romântica dos saraus, a cultura lítero-musical forneceria o elemento essencial ao surgimento de um gênero que identificaria a seresta tradicional.




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