A
morte de Gustavo Bebianno chocou amigos e familiares. Atleta desde a
juventude, o ex-ministro não bebia, não fumava e, de acordo com pessoas
do seu convívio, levava uma vida saudável. Em vídeo, Bebianno disse ter
deixado material sobre Bolsonaro no exterior caso acontecesse alguma
coisa com ele
Gustavo Bebianno morreu na madrugada deste sábado (14)
A morte de Gustavo Bebianno aos 56 anos, chocou amigos e parceiros políticos. Lutador de jiu-jitsu
desde a juventude, Bebianno não bebia nem fumava e inspirava às pessoas
de seu convívio a imagem de uma pessoa saudável, magoada com o
presidente Jair Bolsonaro, a quem ajudou a eleger, mas estimulada por
seu novo projeto político, a disputa à prefeitura do Rio de Janeiro pelo
PSDB.
Por esses motivos, amigos defendem que seja
investigada a causa da morte dele na última madrugada em seu sítio em
Teresópolis (RJ). As informações são de que ele sofreu um infarto por
volta das 4 horas.
Em 29 de outubro de 2019, o ex-ministro revelou sua
filiação ao PSDB e que temia que Bolsonaro desse um golpe de Estado.
Recentemente, Bebianno disse em entrevistas que tinha receio do que
poderia lhe acontecer em razão de suas manifestações públicas a respeito
do presidente e dos bastidores de sua eleição.
O advogado disse a jornalistas e amigos que tinha
material guardado no exterior para que fosse revelado após sua morte.
Também contou que havia enviado cartas a pessoas próximas, contando em
detalhes quem seriam as pessoas interessadas em sua morte caso isso
ocorresse.
Arquivo vivo
Fundadora do movimento Política Viva, do qual
Bebianno participava, a empresária Rosangela Lyra defende que haja uma
investigação sobre as circunstâncias da morte do ex-ministro.
“Temos de ver o que aconteceu. Tudo tem de ser
apurado muito em função das mensagens que ele mencionava nas
entrevistas. Ficamos pensativos, até pelo momento político do país.
Escuta-se falar muito de queima de arquivo, de que existem várias formas
de matar alguém”.
Vice-presidente do PSL, o deputado Junior Bozzella
(SP) disse que ainda não conversou com familiares do ex-ministro, mas
considera importante que sejam tomadas todas as providências para
esclarecer o episódio.
“Ele era um arquivo vivo, a pessoa mais próxima de
Bolsonaro na campanha. A mim nunca me confidenciou nada. Sempre foi
muito republicano e não fazia ilações. Mas é natural que agora surja
todo tipo de especulação”, observou.
“Quando se trata de política, poder, interesse,
tudo tem de ser analisado. Crimes políticos não são raridade no Brasil.
Quando há divergências emblemáticas, como no caso dele, é natural que
terceiros queiram aprofundar as circunstâncias da morte”, completou o
deputado, porta-voz do grupo do presidente do PSL, Luciano Bivar, que
faz oposição à ala bolsonarista.
Entusiasmado
Rosangela e Bozzella contam que perceberam um
Bebianno entusiasmado nos últimos contatos. “Ele estava empolgado com a
candidatura no Rio, buscando alianças. Isso estava dando combustível
para ele. Estava bem focado e convicto de que poderia provocar um
processo de transformação. Eu acreditava muito nele”, disse o deputado.
A líder do movimento Política Viva também guarda a
mesma lembrança. “Ficava impressionada como ele era doce, educado e
gentil naquele corpão. Estava tão entusiasmado com a campanha no Rio.
Chorei por ele ser tão jovem, um atleta. Temos de ver o que aconteceu”,
afirmou Rosangela.
Segundo ela, o seu contato com o advogado era mais
virtual do que pessoal e se intensificou com sua chegada ao grupo que
fundou para discutir práticas de renovação política.
Bebianno presidiu o PSL durante a campanha de Jair
Bolsonaro ao Planalto em 2018, a pedido do então candidato. Considerado
homem de confiança do presidente, foi o primeiro grande aliado com quem
Bolsonaro rompeu após assumir o mandato. Sua permanência no cargo não
chegou a dois meses. Foi demitido por influência do vereador carioca
Carlos Bolsonaro (PSC), filho do presidente.
Carlos via no então ministro o maior obstáculo para
sua estratégia de controlar a comunicação do pai. Ele acusava o
ex-presidente do partido de tramar contra Bolsonaro. Bebianno deixou o
governo e, desde então, havia se tornado forte crítico do presidente.
Material guardado
Em dezembro do ano passado, Gustavo Bebianno
afirmou em entrevista à Jovem Pan que havia deixado material sobre
Bolsonaro no exterior caso acontecesse alguma coisa com ele.
“Se o presidente acha que eu tenho medo dele, ele
está enganado. Eu sou tão ou mais homem que ele. Tenho um material, sim,
e fora do Brasil. Tenho muita coisa e não tenho medo. Uma vez o
presidente disse que eu voltaria para minhas origens, mas minha origem é
muito boa”, afirmou. Também disse à revista Veja que havia mandado
material para que amigos só revelassem após sua morte.
No minuto 31 da entrevista à Jovem Pan, Bebianno diz ter material guardado sobre o presidente:
Nos bastidores do programa de televisão Roda Viva,
do qual participou no último dia 2, Bebianno relatou ter medo de falar
tudo o que sabia sobre os atos que envolvem Bolsonaro. Pressionado por
jornalistas, fora do ar, respondeu: “Está vendo aquele ali [apontando
para o seu filho]? É o meu único segurança”, afirmou. O jovem era o
único na plateia de convidados de Bebianno.
No programa, o ex-ministro contou ter estreitado o
relacionamento com Bolsonaro em meados de 2017 e apontou a facada
sofrida pelo presidente durante a campanha como um divisor de águas no
“grau de loucura” e no aumento de teorias de conspiração dentro do
Planalto.
Segundo ele, a família do presidente trata como traidores
todos aqueles que fazem crítica à sua atuação.
Entrevista concedida pelo ex-ministro há duas semanas ao Roda Viva:
Tentativa de golpe
Em outubro, o ex-ministro disse que Bolsonaro
deixou o poder subir à cabeça, abandonou suas promessas de campanha para
proteger e favorecer os filhos, cercou-se de “loucos” e fazia uma
gestão marcada pelo autoritarismo, pelo “desarranjo mental”, pela
irresponsabilidade e pelo “desgoverno”.
O ex-ministro afirmou, na ocasião, acreditar que o
desfecho da passagem de Bolsonaro pelo Palácio do Planalto será mais uma
página triste da história política brasileira: ou ele renunciará, ou
sofrerá impeachment ou, na hipótese mais grave, tentará uma ruptura
institucional, um golpe de Estado.
“Não acredito que ele conseguiria consolidar uma
ruptura institucional, mas tudo indica que ele vai tentar. É muito
preocupante. Uma simples tentativa pode gerar muito derramamento de
sangue. O Brasil não precisa disso. É um risco real”, disse.
Assassinato de miliciano
O nome de Bebianno foi parar na lista dos assuntos
mais comentados do Twitter. Parte dos seguidores associava a morte do
ex-ministro ao assassinato, em fevereiro, do ex-policial Adriano
Nóbrega, apontado pelos investigadores como chefe da milícia Escritório
do Crime. Ele estava foragido desde janeiro de 2019 e morreu durante uma
operação policial no interior da Bahia. A morte dos dois foi citada
como uma possível queima de arquivo.
Nóbrega morreu durante uma operação policial no
interior da Bahia. A trajetória de Nóbrega se cruzou com a da família
Bolsonaro algumas vezes. O senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ) já
fez homenagens ao ex-policial militar e empregou em seu gabinete a mãe e
a mulher dele.
Quando era deputado, Bolsonaro também defendeu na
Câmara a atuação do miliciano. As ligações vieram a público após a
abertura de investigações sobre o esquema de rachadinha no gabinete de
Flávio na Assembleia Legislativa e o assassinato da vereadora Marielle
Franco (Psol).
Adriano era acusado de chefiar o grupo de
assassinos profissionais aos quais estão ligados os principais suspeitos
de participação no assassinato de Marielle e seu motorista,
Anderson
Gomes. Também era suspeito de participar do esquema de apropriação
indevida de salários de servidores do gabinete de Flávio na Alerj.