Nessa disputa, alguns países já se posicionaram em defesa dos iranianos, caso da China e da Rússia, mas várias outras nações e blocos, como a União Europeia (UE), se limitaram apenas em pedir paz e diplomacia. No caso da UE, o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, não condenou categoricamente o ataque americano e se limitou a dizer que “uma escalada [de violência] deve ser evitada a todo custo”.
Para o ex-primeiro ministro português José Sócrates, esta não deveria
ter sido a postura do bloco. “É um grave problema. Foi uma violação do
direito internacional gravíssima. Mataram um dirigente de um país que
consideravam inimigo. Trata-se de um ato de selvageria. Como que é o
mundo reage a isso?”, questionou, em entrevista exclusiva à CartaCapital.
“Se a Europa não condena a ação de um país que mata um signatário de
um outro, ela está, no fundo, normalizando a situação, abrindo um
precedente gravíssimo. Isso é abrir as portas do inferno. É jogar no
lixo décadas de construção de um direito internacional que todos
aceitaram, inclusive os EUA”, acrescentou Sócrates.
O ex-primeiro ministro também criticou a posição da Organização das
Nações Unidas (ONU), que se limitou a pedir moderação aos líderes. “A
ONU deveria considerar ilegal este ato, mas ainda não o fez. É preciso
condenar este ato unilateral de selvageria, de matar um líder de um
outro país, violando todas as regras internacionais”, pediu.
Consequências econômicas
Com o ataque aéreo, o preço do petróleo subiu para seu maior nível em
mais de três meses. O tipo Brent fechou em alta de 3,6%, maior valor
desde meados de setembro, quando instalações petrolíferas da Arábia
Saudita sofreram ataques. O Iraque, segundo maior produtor da
Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep), exporta cerca de
3,4 milhões de barris de petróleo bruto por dia.
Sócrates vê a crise entre os países como algo perigoso para a
economia global, em especial para a União Europeia, que importa muito
petróleo. Mesmo assim, ele considera que o bloco deveria ter se
posicionado com mais firmeza. “De qualquer forma, isso é pouco
significativo. O fato em si já afetará o clima geral de estabilidade do
mundo e a economia sofrerá”, analisa.
Para o político, no entanto, os maiores prejudicados com o ataque
serão os próprios americanos. “Eles deram um tiro de canhão na sua
própria credibilidade. Eles precisam assumir o erro e serem
responsabilizados”, defende. “Não é só o presidente Trump quem tomou a
decisão, diversas instâncias que autorizaram o ataque. Espero que isso
não comece uma guerra e torço para que todos saibam medir os passos que
vão dar a partir de agora. Tudo isso é um agravo.”
Guerra ao terror
Durante a conversa com CartaCapital, José Sócrates
deu detalhes sobre seu novo livro, cujo tema será a guerra ao terror e a
utilização de drones em ataques militares, prática que começou durante o
governo Barack Obama e tem se intensificado.
Para o ex-primeiro ministro português, essa nova ofensiva
americana com aviões não tripulados é “infame e covarde”. “Esse novo
tipo de arma tem uma característica diferente: ela permite que você não
se exponha. Permite matar quem quer que seja sem ser visto”, explica.
“No fundo, trata-se de uma execução extrajudicial ilegal, feita de
uma forma covarde, à distância, sem que o adversário se exponha. Uma
luta feita com a proteção de uma das partes”, analisa Sócrates, que
acredita que o combate ao terror, que teve início a partir do ataque às
torres gêmeas de Nova Iorque, fracassou e tem desestabilizado a
democracia no planeta.
“Hoje, há mais terrorismo do que há 18 anos, e ele é mais disperso e
global do que antes. Além disso, também temos mais refugiados do que
nunca. Isso cria e aprofunda crises políticas e afeta a democracia de
diversos países”, explica. “A guerra contra o terror é uma guerra que
não deu certo. O combate ao terrorismo é mais danoso às democracias do
que o próprio terrorismo.”
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